Ensaios sobre Cinema, Filosofia e Educação

Notas pessoais sobre cinema, filosofia e educação

domingo, fevereiro 26, 2006

Comentários sobre o filme "Edukators"

"Edukators" é um filme alemão, do cineasta Hans Weingartner, sobre três jovens: Jan, Peter e Jule. Eles sofrem sérias privações em função de suas situações financeiras. Movidos por ideais socialistas, eles promovem manifestações pacíficas em protesto contra a desigualdade social.

Um fato que chama a atenção são os elementos conceituais que esses jovens alemães utilizam para fundamentar suas ações. É mister uma reflexão sobre a profundidade com que tais propriedades são ainda determinantes nas relações e no modo de vida do homem contemporâneo.

Jan e Peter, principalmente, investiam suas aspirações na crença de que suas manifestações poderiam culminar com a libertação do mundo das garras da tirania burguesa. É curioso que esses rapazes compreendam o mundo atual com um certo cenário do século XVIII, formado após a Revolução Francesa e que se estendeu até praticamente a década de 90 do século passado, acabando por se desconfigurar, de certa forma, com a queda da União Soviética.

Embora o mundo capitalista ainda obedeça a lógica do capital, alguns avanços já ocorreram no que diz respeito aos direitos humanos. Hoje os trabalhadores contam com legislações que lhes garantam direitos, boas condições de trabalho e de vida. É claro que estas conquistas não podem anular o fato de que o ambiente atual ainda é muito favorável à alienação pois o consumo é o colorário do meio de produção capitalista e, em função deste aspecto, o homem contemporâneo é ainda condicionado por necessidades artificiais.

Além disso, o problema da desigualdade social é um problema ainda não resolvido. Se fosse possível dar uma forma mitológica ao atual sistema que comanda as relações humanas, seria fácil retratá-lo como um reino cuja estrada de acesso esteja bloqueada pelo grande monstro Esfinge, que interrompe o avanço dos mortais ao dito paraíso mediante a famigerada convocação: "decifra-me ou devoro-te". Aqueles que conseguem decifrar o "enigma" da técnica, tem sua passagem liberada, enquanto que os demais são precipitadas a toda sorte de privações.

Todavia, é difícil não encarar as motivações da Jan e Peter como uma lembrança romântica dos tempos em que os soviéticos controlavam o leste europeu. Época esta em que o desemprego, nesta região, atingia níveis quase nulos. Não só na Europa, mas também na própria Rússia, é comum ouvir ou ler relatos nostálgicos. Alguns jornais já noticiaram que os russos, depois de terem experimentado a Coca-Cola e o Big-Mac, sentem saudades da burocracia socialista. Eles afirmam que o serviço público era mais eficiente e o atendimento era muito melhor.

Em "Edukators", tal aspecto é retratado de forma muito interessante. O magnata Hardenberg, em contato com os jovens idealistas, passa a recordar-se da sua juventude marcada pela militância. Em uma das falas do personagem, ele relata que acabou esquecendo este passado de lutas quando, com o seu casamento, passou a se preocupar em adquirir um lugar fixo para morar, depois vieram os filhos, superações de problemas e desafios, até que acabou dando certo nos negócios lançando definitivamente suas reminiscências juvenis ao enfadado lugar das "boas lembranças".

Talvez seja realmente fundamental que todas as necessidades artificiais cultivadas pelo ser humano atualmente sejam supridas a ponto de que, liberto de tais preocupações, possa voltar seus olhos novamente para o rastro de desigualdades, criminalidade, miséria, fome, devastação do meio ambiente, deixadas pelas operações em torno do capital.

Entretanto, as manifestações dos jovens "Edukators" são comoventes pois elas deixam muito claro que os jovens ainda se preocupam com o rumo que a sociedade tomou ansiando por transformações. Apenas ainda falta um mecanismo que realmente leve ao "super-aquecimento" a atual máquina política e econômica tornando indispensável o surgimento de reais alternativas.

Dica de leitura:

ZOLA, Émile. Germinal. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.